Graciella Fabricio da Silva
Educação e movimento estudantil no Brasil (2015-2021)
Atualizado: 13 de abr. de 2022
Neste texto, pretendo analisar o significado das mudanças e interferências da classe dominante em relação à legislação educacional desde o golpe contra Dilma Rousseff até o governo Bolsonaro, observando a forma como o movimento estudantil lidou com essas questões.
O biênio 2015 e 2016 foi marcado por uma série de lutas travadas na sociedade brasileira. Entre elas, as protagonizadas por estudantes secundaristas talvez tenham sido as que mais ganharam destaque nas redes sociais e nas mídias tradicionais. Inspirados na “Revolta dos Pinguins” realizada por secundaristas e universitários das escolas e universidades públicas e privadas do Chile, em 2006, os jovens da rede estadual de ensino de São Paulo ocuparam mais de 200 escolas estaduais, no final de 2015. O objetivo era barrar a proposta de reorganização escolar do governo de Geraldo Alckmin (PSDB). Passados cerca de três meses desde o início das ocupações, a força da mobilização estudantil conseguiu fazer com que o governo paulista voltasse atrás no projeto que acarretaria o fechamento de unidades escolares e impactaria negativamente o cotidiano dos discentes e de suas famílias.
Ainda em 2015, os secundaristas do estado de Goiás também ocuparam as escolas públicas do estado. Lá, a finalidade era impedir que o governo do estado avançasse com o projeto neoliberal de privatização da gestão das escolas goianas por meio da contratação de Organizações Sociais (OSs). Após uma série de batalhas (marcadas por forte pressão do governo estadual), a Justiça considerou que a medida era ilegal.
O ano de 2016 se iniciou com o crescimento da luta secundarista, que se espalhou como uma onda para outros estados. Em março desse ano, estudantes das escolas estaduais do Rio de Janeiro deram início a um movimento que alcançou 80 escolas. Eles apoiavam a greve dos professores e incorporaram as reivindicações dos docentes, entre as quais se destacam o fim da avaliação externa aplicada pelo governo do estado (o SAERJ), a ampliação da carga horária das disciplinas de Filosofia e de Sociologia (que contavam com apenas um tempo de aula semanal, até então), o investimento na infraestrutura das unidades escolares e o fim do currículo mínimo imposto às escolas pela Secretaria de Educação do estado. Além disso, o passe livre estudantil e o direito à formação de grêmios autônomos constavam na pauta dos estudantes. O movimento durou três meses e se encerrou após uma série de audiências mediadas pela Justiça envolvendo os estudantes e a SEEDUC. Ainda nesse ano, ocupações ocorreram em outros estados (como Ceará e Bahia). As pautas eram semelhantes e apontavam para uma mesma questão: a precarização da educação pública causada pelas políticas neoliberais.
Ainda 2016, o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff (PT) abriu caminho para o aprofundamento da precarização já existente no cotidiano da classe operária brasileira. Durante o governo de Michel Temer (MDB – 2016-2018), a agenda neoliberal foi fortalecida e novos ataques aos direitos dos trabalhadores e aos serviços públicos foram feitos. Como exemplos, pode-se citar a reforma trabalhista e a reforma do ensino médio. A primeira representava um retrocesso nos direitos dos trabalhadores e um aumento da precarização do trabalho, ao passo que a segunda preparou o sistema educacional para formar mão de obra conforme as necessidades do patronato na nova fase de precarização estrutural do trabalho. Se as mudanças na legislação permitiram a maior exploração da força de trabalho, as alterações na formação básica dos trabalhadores visavam adequar corações, mentes e corpos à nova realidade.
Essas medidas foram duramente criticadas e combatidas por diferentes frações da classe trabalhadora e do movimento estudantil. Este, mais uma vez, recorreu às ocupações para pressionar pela não aprovação da reforma do ensino médio. Estudantes secundaristas e universitários ocuparam mais de mil escolas e universidades de diferentes estados contra a proposta do governo Temer. Entretanto, dessa vez a pressão dos estudantes não foi suficiente para impedir a sua aprovação.
Tendo em vista o que ocorreu de 2016 até 2018, cabe perguntar como o governo Bolsonaro tem lidado com essa questão. É possível afirmar que ele não apenas deu continuidade, mas também aprofundou o processo de ataque à educação, por meio de medidas como: a redução do orçamento da área, propostas que tratam do ensino domiciliar, a tentativa de aprovar o projeto Escola sem Partido e a implementação da reforma do ensino médio. Nos próximos textos desta coluna, pretendo aprofundar algumas dessas medidas, observando seus efeitos e impactos.
Créditos da imagem destacada: Brasília - Alunos ocupam Colégio de Samambaia em ato contra a reforma do ensino médio, a escola tem 1,7 mil alunos e a aula foi cancelada (Wilson Dias/Agência Brasil). Wikimedia Commons.
Ver ZIBAS, Dagmar. A “Revolta dos Pinguins” e o novo pacto educacional chileno. Revista Brasileira de Educação¸ v. 13, n. 38, maio/ago. 2008. Ver também o documentário de Carlos Pronzato, “A Revolta dos Pinguins”, disponível aqui: https://www.youtube.com/watch?v=tetACHaxxJU&t=26s. Pronzato também dirigiu um documentário sobre as ocupações realizadas no estado de São Paulo, em 2015, que pode ser assistido aqui: https://www.youtube.com/watch?v=LK9Ri2prfNw .
Alguns problemas da reforma do ensino médio também foram apontados em artigo de minha autoria publicado aqui no História da Ditadura.
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